Sentados nos bancos de jardim, em frente à igreja de Alvôr, ouvia atentamente o meu avô:
– Sabes quando isto que te vou contar aconteceu, tu ainda não tinhas nascido.
A Europa encontrava-se em guerra. Portugal era um país neutro, mas a vida era muito difícil, havia racionamento de bens, como o açucar , o café, a manteiga, os cereais, havia falta de quase tudo. Nessa altura o avô trabalhava mais do que o costume para que lá em casa nada faltasse
Então com um tempo de vendaval, o avô resolveu sair para a pesca, esperando que mais uma vez tivesse sorte e apanhasse o peixe que mais ninguém se atrevera a arriscar.
Mas nesse dia a coisa correu mal.
Quando saímos a barra o mar começou a ficar medonho. As vagas eram tão altas, que quase partiam pelo meio a ” Isabel Lourenço“.
O vento e as vagas varriam o convés de uma ponta à outra.
Era já madrugada e aquilo não havia meio de parar.
Eu mantinha-me na casa do leme quando um camarada me chamou:
Venha aqui mestre Zé!
Quando cheguei à casa da máquina os camaradas choravam:
– Mestre Zé, vamos morrer todos… o barco não aguenta isto por muito mais tempo!!!
– Venha… junte-se a nós, vamos rezar ao Senhor Jesus de Alvôr.
– Eu não me acredito nessas tretas!
– Nós acreditamos por si!
– Por favor mestre Zé… acompanhe-nos nesta promessa.
E minha filha, eu vi… cinco homens valentes… chorando como crianças… implorando pela sua fé aos céus que lhes valesse , que acalmasse as águas revoltas e salvasse as suas vidas.
Prometeram que encheriam o altar do Senhor Jesus de velas, de cada vez que visitassem Alvôr.
E depois Avô o que aconteceu?
Depois o dia clareou, o vento amainou e o ” Isabel Lourenço ” voltou são e salvo ao ponto de partida.
Por isso aqui estou eu e tu a honra-los na sua promessa.
Eu e o Avô na Praia da Rocha (Portimão) em 1955