A Banhos na Pancada

Ficava a duzentos e cinquenta metros de altitude, na encosta de Monchique, a sete quilómetro da Aldeia. A casa feita de granito e xisto, era onde vivia o  senhor Amílcar. Ver “O Mestre licoreiro” e o “Alquimista“.

Ao lado havia um casebre, com um grande alambique em cobre, onde o senhor Amílcar destilava a aguardente de medronho e fazia os seus licores.

Em frente da casa tinha uma horta e a perder de vista ,um pomar de frutas que a  tia Ana cuidava com desvelo.

Na cavalariça, estava um macho chamado “Ruivo”, que atrelavam a uma carroça, quando era preciso ir à aldeia vender os artigos que fabricavam.

Não faltava nada naquele monte. A mesa estava sempre posta com presunto de porco preto, chouriças, queijo fresco, mel, muita fruta e o pão que a Ti Ana cozia no forno de lenha.

As galinhas andavam à solta, e eu dava-lhes pão, milho e couves.

Tinham oito ovelhas,  cada uma com seu nome,  que pastavam à vontade e se as chamássemos vinham comer à nossa mão.

Também havia uma vaca malhada chamada “Estrelinha”, que dava um leite grosso e gostoso cheio de nata.

Era aqui que nós passávamos a última semana, para o Avô fazer a sua cura  das águas termais à bronquite e a Avó aos rins e ao reumático.

O senhor Amílcar nasceu na serra e conheci-a como à palma das suas mãos. Ele sabia onde nasciam as águas curativas.

Só fui com eles uma única vez. Pelo caminho ia-nos mostrando árvores, ervas e plantas medicinais. Lembro-me de termos parado num riacho e de ele ter apanhado para mim uma linda borboleta, mas o cansaço foi tal que quando chegamos a casa, eu só acordei no outro dia.

A cascata de água quente e cristalina de onde se banhavam e bebiam a água estava dentro de uma gruta em plena serra, e o barulho da água era tão estrondoso que os locais lhe chamavam de “Pancada”.

A verdade é que quando faziam este tratamento, passavam um santo inverno.

Eu ficava com a Ti Ana que assim que os apanhava longe, ia ao alambique e enchia um copo de medronho acabado de destilar, e depois de um grande Aaaaaah!!!!! Dizia:

Sabe uma coisa menina… este ano a aguardente está mais fraca.

 

A Mulher e a Sardinha quer-se pequenina.

O meu avô avaliava as mulheres como se de peixe se tratasse.

Eu era a Pescadinha; uma mulher feia e metediça era uma ” Uge” (raia gigante com ferrão na ponta do rabo); uma mulher muito bem feita, era “Pescada do Alto”; Uma mulher com boca grande era “uma boca de Charroco” e com olhos grandes era uma “Boga”. Havia ainda “a Cavalona” que era uma mulher atiradiça.

Mas a personificação da mulher perfeita era a sardinha, que se queria pequenina e saltitante.

Maria Isabel era uma rapariguinha loira, com olhos cor do mar em dia de sol. Baixinha e muito remexida, era a filha mais nova do Senhor Costa.
Foi amor à primeira vista, ela parecia uma sardinhita prateada.

– Queres casar comigo Maria?

Casou com ela, e deixou-a grávida, a viver na casa da mãe.

Chegado a Lisboa, arrendou uma casa na rua das Hortas, no número dezoito, em Pedrouços, perto da doca com vista para a Torre de Belém.

Foi nessa casa Que nasceu Susana, a primeira filha do casal. A tia “Xana”.

O pedófilo

O quarto verde era o maior de todos os quartos daquela casa. Foi para lá que a tia Adelina e o “Pico” foram viver, quando se casaram. O avô comprou-lhes a mobília de quarto, e passaram a comer lá em casa.

O “Pico” arranjou trabalho na fabrica Braço de Prata, era uma fábrica, de armas e munições.

À tarde quando vinha do trabalho, trazia-me sempre ou um chocolate ou um pequeno brinquedo ou livros. Depois sentada no seu colo, eu vivia as histórias que ele me contava. Os três porquinhos, a branca de neve, o soldadinho de chumbo etc…. etc… etc… .

Quando me deixava dormir no cinema ou na esplanada, era ele que me trazia para casa ao colo. Dava-me banho, deitava-me e ensinou-me a importância de ler.

Um dia pediu-me para ir brincar com ele às escondidas para a cave.