A praça estava cheia. As senhoras apresentavam-se bem vestidas cheirosas e de mantilhas na cabeça.
Estávamos no ano de 1957.
A orquestra iniciou: – TÁ TÁ RÁ RIIIII…
A corrida à antiga portuguesa ia começar e o meu avô que era aficionado da festa brava ia explicando:
-Este cavaleiro é o “NETO”! …representa a autoridade na arena. Seguem-no os pajens.
O “NETO” abriu as cortesias (que são a apresentação dos intervenientes na corrida).
Entram na arena, seis charameleiros, que tocam uma espécie de cornetin e um timbaleiro que toca tambor e tímbalos. Apresentam-se vestidos a rigor e são eles que abrem o espectáculo, dando-lhe pompa e circunstância.
O “NETO,” ordenou a entrada dos porta estandartes, que no século XVII representavam as casas reais. Seguiram-se-lhes os pajens dos cavaleiros.
Entram agora os coches, puxados por parelhas de cavalos, ricamente engalanados, que transportam os cavaleiros, com suas belas vestes e se dirigem à tribuna para saudar (no tempo antigo) o Rei. A pé ladeando os coches, seguem os alabardeiros, fazendo a guarda dos cavaleiros.
A orquestra faz-se ouvir….acabam de entrar os palafreneiros, que conduzem à mão os cavalos de combate.
E o Avô disse:
-Agora acabaram as cortesias:
Depois de todos saírem, entram os forcados com a azémola das farpas, que por não ser um animal nobre é obrigada a sair a correr da arena..
Agora o “NETO” entrega a chave dos curros e dá a volta à arena, saudando todos os presentes.
Até aqui foi tudo muito bonito e colorido.
Quando o toiro irrompeu na arena, vinha chateado e enraivecido. Reparei que fios de sangue lhe escorriam pelo lombo, devido a um ferro que trazia espetado. Um bandarilheiro, muito aperaltado num justíssimo fato cor de rosa, salpicado de lantejoulas , chamava o toiro em altos berros:
-Heiiii ……toiro….. Heeeiiii!!
O Toiro solta um rugido e investe e o toureiro apontando-lhe os ferros cravou-lhe no cachaço duas bandarilhas. Na praça o povo aplaude e grita;
– Óóóólééé.
O Cavaleiro, montando um cavalo lusitano, entrou em praça, garboso na sua casaca azul dourada. Os ajudantes entregam-lhe dois ferros longos, prontos para serem cravados no animal.
-Heeii Toiro … Heeeiiii… incitava o Cavaleiro!!!
De repente o Toiro investiu e o Cavaleiro espetou-lhe as farpas. A orquestra iniciou um Pasodoble, que o povo acompanhava com palmas e óóólééés..enquanto o sangue escorria pelo cachaço do Toiro.
O Cavaleiro voltou a incitar o Toiro, que espavorido voltou a investir, sendo castigado com mais duas farpas no lombo. A orquestra voltou a tocar e as gentes em euforia gritavam e batiam palmas a compasso. Mais dois ferros foram espetados no seu dorso, e as pessoas em delírio gritavam…
-Óóóólééé…
-Avô…Avô, eles assim matam o toiro!!!
E as lágrimas corriam-me pela cara abaixo.
-Porquê… porquê isto?
Ferido e desorientado o Toiro também parecia perguntar:
-Porquê?
Era a vez do grupo de forcados incitarem o pobre bicho que já cansado e ensanguentado os olhava admirado
-Ouuuiiiii…..Ouiiii…..Ouuuiiiiiii, gritava o maluco que vinha à frente…o toiro raspava o chão com as patas e grunhia de raiva e dor….e de repente fazendo Zig Zag… atacou!!!
Os três primeiros voaram pelo ar e estatelaram-se no chão onde foram pisados quanto baste, mas um manteve-se estranhamente agarrado ao rabo do bicho, sendo arrastado, enquanto os feridos eram retirados em maca.
Eu sequei as lágrimas e bati palmas de satisfação.
Fui obrigada a ver muitas mais corridas enquanto pequena e posso dizer que sempre torci pelos toiros. Mas as largadas de toiros essas eram as minhas preferidas…ora vejam.
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