Era em Olhão, vila branquinha, com suas ruas sinuosas, lembrando labirintos e as suas casas em forma de cubos, tendo por telhados açoteias e mirantes, que nós passávamos alguns dias em casa de familiares.
À noite na açoteia, olhando o céu estrelado o Avô explicou-me como aquela estrela que brilhava mais que todas, era importante para os pescadores e que se chamava Estrela Polar, ou do Norte.
Ao redor os familiares juntaram-se a nós, trazendo figos secos com amêndoas e nozes, bolinhos de amêndoas e alfarroba e o medronho da Serra de Monchique que o meu avô tanto apreciava. À vez iam contando lendas, histórias e costumes Algarvios.
Quase todas as lendas falavam de mouras encantadas dentro de poços, onde à meia noite se ouviam os seus lamentos, à espera que alguém corajoso lhes quebrasse o encanto.
As lendas dos lobisomens e de almas penadas também me arrepiavam.
E as pragas malévolas que as mulheres antigas rogavam a quem as contrariava… eram assim:
Não sabia dar-te já uma dor tão grande que nunca mais passasse, que quanto mais corresses mais te doesse e, se parasses rebentasses.
ou então:
Permita Deus que fiques tão magro… tão magro… tão magro… que passes por o fundo de uma agulha de braços abertos.
ou ainda:
Permita Deus que tenhas uma febre tão grande… tão grande que até te derreta a fivela do cinto.
Com toda esta riqueza verbal, eu adormecia embalada pelo reino da fantasia.
De manhã apanhávamos o barco para um dia bem passado na bela praia da ilha de Armona.
Depois da praia, lambuzava-me com um gelado de três bolas no jardim de Olhão.
Tudo isto faz parte de um universo mágico que relembro com muita saudade.
E deixo-vos com este brejeiro baile mandado, com as môças e môces marafades do meu Algarve.
À esquerda roda o bailo
Uma velha com um chocalho
Á esquerda roda a coxa
Carrapatos na xoxa
A esquerda roda o bailo
À direita o corridinho
Toda a moça que é bonita
Também dá o seu peidinho