A Procissão

Chegou o dia. Era dia da procissão do Senhor dos Passos. Os sinos tocavam, cheirava a incenso e pétalas de flores. As janelas enfeitadas com lindas colchas emolduravam as ruas por onde a procissão ia passar.

Eu e o meu Pai íamos participar pela primeira vez numa procissão. Ele, de Opa vermelha com a cruz de Cristo ia pegar no andor do Senhor dos Passos. Eu ia a acompanhar a procissão como anjinho com um vestido de tafetá branco, peitilho com folhos, rematado por uma faixa de cetim azul. Nos ombros umas asas de penas brancas presas ao vestido por elásticos davam-me um ar celestial. Ao meu lado, um menino vestido de São Roque protestava:

-Oh mãeeee, eu não quero ir vestido de “serrote”

O andor, com Jesus Cristo vergado sobre o peso da enorme cruz, devia ser pesadíssimo, pois era carregado por 8 homens fortes (incluindo o meu Pai)

A Minha Mãe, obreira daquela nossa forçada manifestação religiosa estava muito satisfeita. Pudera, não era ela que carregava o andor.

Às tantas, o Padre nunca mais se calava e o São Roque já cansado deixou cair o cajado. O meu Pai muito vermelho já bufava por todo o lado e a mim, começaram-me a escorregar as asas. Foi quando me pus a gritar:

-Oh mãe… quero fazer chichi!!!

À noite é que foram elas. O ombro do meu Pai estava roxo e em carne viva. Ao ver-se ao espelho ele gritou-lhe:

-Granda puta… já viste o que fizeste? tu e o padre precisavam era de um enxerto de porrada.

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Maria Rosa

Maria Rosa fez-se uma linda mulher e o meu pai caiu de amores por ela.

Ela não lhe deu grande bola era filha irmã e neta de pescadores. Sabia bem as dificuldades que isso acarretava.

Não queria para ela essa vida, queria para ela alguém que não estivesse ligado ao mar.

Além disso havia certo rapaz que trabalhava na construtora e era amigo do Jorge…

Quando soube, o meu pai fez uma cena de ciúmes.
Depois mexeu os cordelinhos junto dos irmãos e do pai de quem era amigo e companheiro de trabalho.

Convenceram-na. Ou o Zé Ganso, que conheciam desde miúdo e até tinha um pé de meia para quando casasse, ou mais ninguém. O outro não o conheciam de lado nenhum.

Ela argumentou que o Zé bebia às vezes, e andava com mulheres da vida.

É sinal que não é maricas, foi a resposta.
Até a mãe lhe disse: – Filha quando casar ele assenta.

A minha mãe

Maria Rosa (Mãe)

 

Era uma rapariga morena, de cabelos pretos compridos e ondulados. Os seus olhos verde escuros, tinham os seus mistérios. Na boca bem desenhada sempre um sorriso, mas o que mais sobressaía era o peito, generoso e empinado.

Chamava-se Maria Rosa e era a filha mais nova do ti Zé Ramos e da senhora Adelina.

Moravam na rua das Hortas, e o ti Zé Ramos trabalhava com o filho Américo no barco do meu avô.

A ” Rosinha dos limões ” como o meu pai lhe chamava, estava sempre lá em casa.

Era a grande amiga da minha tia Susana.